domingo, 29 de maio de 2016

Dia grande

(Homenagem de um pai orgulhoso, a uma filha que concluiu uma importante fase da sua vida.)

os grandes dias
chegam como os outros:
pela manhã.
com um despertar igual
a tantos já passados.

mas depressa adquirem
o brilho intenso
e a magia que os irá perpetuar
muito para lá
das fronteiras do esquecimento.

que hoje seja esse dia grande
que sempre despontou nos teus sonhos.
nos mais tímidos
e nos mais arrojados.
na ânsia que tinhas de aqui chegar.

é agora.
o destino correu muito
para decifrar este mistério.
viajou por lugares inóspitos
e sem data na memória.

vacilou.
perdeu-se algumas vezes.
mas aqui está ele
de braços estendidos.
acolhe-o.

é agora.
abre as janelas
e deixa o sol entrar.
hoje será um dia
para sempre recordar.

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domingo, 22 de maio de 2016

O amor acha sempre uma saída


no coração ainda assobiam sinos
contrariando negras profecias
que o davam já como defunto
o sangue não estagnou de todo
no caudal que as veias transportam
até aos lugares inauditos
onde os barcos vão desencalhar

o outono não aniquilou a esperança
nem fechou as portadas do templo
rodas invisíveis continuam a girar
alimentando a chama entorpecida
apesar do frio que se faz sentir
o amor há de achar outro caminho

o amor acha sempre uma saída

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terça-feira, 17 de maio de 2016

Remendando o futuro


sento-me
à sombra da embarcação
encalhada na areia seca
a olhar o mar
a sua vastidão ondulante
e o horizonte na outra margem
distante
e inatingível

aproveito
esta pausa breve
a ausência de tempestades
para estender as redes
sobre os joelhos trémulos
e com linha de nylon
remendo o futuro
que ameaça romper-se

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domingo, 1 de maio de 2016

No fundo da taça


nunca andei de avião
nem acariciei a brancura da neve
nunca passei uma noite num hotel
nem comi comida de hospital
nunca fiz voluntariado
nem tive cão algum
para ir passear a solidão
à noite pelas ruas desertas

nunca andei a cavalo
sem ser nos sonhos mais selvagens
nunca senti saudades
dos lugares que não conheci
nem esperei quem me levasse
pelo caminho certo
ou me desse um dia a provar
o aparato do júbilo

se segurasse a minha vida
numa mão fechada
e a espremesse gota a gota
para um copo de pé alto
quem seria capaz de reconhecer
a tonalidade púrpura dos sonhos
no líquido ralo e acre
depositado no fundo da taça?
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